
O farol de Popper
No cenário idílico de Muxía, erguem-se dois pilares de significado e espiritualidade: o Farol e a Igreja. Neste local sagrado e majestoso, onde elementos naturais e construções humanas se entrelaçam, chega uma peregrina solitária.
À sombra da grandiosa igreja e, cansada pelo longo caminho percorrido, tira a mochila dos ombros e encontra um lugar isolado próximo ao farol. O seu semblante revela uma mescla de exaustão e determinação, uma jornada espiritual que a trouxe a este local. Senta-se em meditação à procura não apenas de descanso para o corpo, mas também um momento de introspecção e conexão com algo maior.
O farol, com a sua luz intermitente que corta o céu noturno, é uma testemunha silenciosa desse encontro. Ele não ilumina apenas o horizonte do mar, mas também simboliza a busca da peregrina pela clareza interior. A Igreja de Muxía, com a sua história venerável, oferece um refúgio espiritual.
Neste momento de meditação solitária, a peregrina e o ambiente ao seu redor tornam-se num só. É uma jornada que transcende o físico e alcança o âmago da experiência humana.
Um pouco atrás, com uma espiritualidade diferente da caminhante, encontro-me eu, imerso na leitura de umas das obras de Popper. O cenário à minha volta é tão majestoso quanto a filosofia que habita as páginas desta bíblia. O farol erguido como uma sentinela, ilumina o caminho da minha mente em busca do conhecimento. Assim como o farol corta a escuridão do desconhecido, as ideias de Popper iluminam o caminho da sociedade através das águas turvas da incerteza, orientando-a em direção a um horizonte de pensamento livre.
O mar que circunda o farol parece representar o contexto sociopolítico em constante mudança. As suas ondas agitadas simbolizam as correntes da história que, por vezes, tentam arrastar a sociedade para longe dos princípios da liberdade e da crítica. No entanto, o farol permanece firme, resistindo à maré da conformidade e da intolerância. Assim como a sociedade enfrenta desafios e turbulências ao longo do tempo, o farol de Popper é um lembrete de que os valores da razão e da liberdade devem ser mantidos firmes, independentemente das circunstâncias. Ele permanece como uma constante na paisagem em constante mudança, uma âncora de esperança e orientação.
As rochas que cercam o farol são representações visuais dos inimigos da sociedade aberta identificados por Popper na sua obra. Cada uma delas é uma manifestação das ideias e sistemas que ameaçam a liberdade e o progresso. Estas rochas representam o historicismo, o marxismo, o idealismo platónico, os autoritarismos e as ideologias dogmáticas. São obstáculos no caminho da sociedade em busca da verdade e da liberdade. No entanto, o farol lança a sua luz sobre essas rochas, tornando-as visíveis e convidando a sociedade a enfrentar esses desafios com pensamento crítico e tolerância.
Nessa paisagem imaginária, o farol de Popper não é apenas um farol, mas um símbolo da luta contínua pela sociedade aberta. Ele representa a luz da razão, da liberdade e da crítica que orienta a humanidade, mesmo diante das adversidades. É uma metáfora da esperança de um mundo onde os valores de Popper prevalecem, onde suas as ideias são iluminadas como estrelas num céu noturno.
Fotografia e texto: Sérgio Moreira

